Controle de risco necessário reduz possibilidade de retornos mais elevados, o que limita atratividade de fundo para investidor em busca de rentabilidade competitiva
A indústria dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) tem se consolidado como um dos segmentos mais dinâmicos do mercado brasileiro. Com um crescimento acumulado de quase R$ 140 bilhões nos últimos 12 meses, o patrimônio dos FIDCs alcançou quase R$ 590 bilhões em dezembro de 2024, conforme dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Essa expansão acelerada reflete a atração crescente que os FIDCs exercem sobre investidores institucionais, um movimento ainda mais fortalecido pelas novas regras tributárias.
Desde a implementação da Lei nº 14.754, em dezembro de 2023, as alíquotas foram ajustadas para um modelo fixo de 15% sobre a distribuição de rendimentos, além da eliminação do “come-cotas”. Essa modificação trouxe uma vantagem competitiva aos FIDCs em comparação a outras classes de ativos, aumentando o apelo entre investidores.
Entretanto, os avanços regulatórios para os FIDCs vão além das questões fiscais. A Resolução 175 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu novas perspectivas ao autorizar o investimento direto em FIDCs por investidores de varejo. Esse movimento expande as oportunidades para a classe, mas impõe uma série de desafios, especialmente no que diz respeito à adaptação dos produtos ao perfil do investidor de varejo.
Nesse primeiro passo para a aproximação do varejo a esses fundos, a CVM impôs restrições adicionais para que esses produtos se tornem mais acessíveis e adequados ao perfil do pequeno investidor, ainda que tais requisitos criem um processo de adaptação para gestores e estruturadores. Assim, ainda são poucos os FIDCs voltados ao varejo disponíveis no mercado.
A entrada do varejo nos FIDCs é cercada de cautela regulatória, com regras rigorosas que visam equilibrar o potencial de rentabilidade com a proteção ao investidor. A CVM determinou que o acesso do varejo fosse limitado a cotas seniores, exigindo também uma avaliação de risco realizada por agências especializadas. Esse conjunto de exigências, por si só, é um mecanismo importante para mitigar riscos e garantir a segurança do investidor menos experiente, marcando um primeiro passo estratégico para a inclusão de um público mais amplo no mercado de FIDCs.
A autarquia ainda foi além, restringindo o investimento do varejo em FIDCs via fundos de fundos, exigindo que o fundo master mantenha uma política de investimento específica. Além de investir somente em títulos com ratings elevados, o FIDC não pode adquirir direitos creditórios originados pela negociação de produtos e serviços para entrega futura, exceto se forem vinculados a concessionárias de serviços públicos ou a projetos de infraestrutura e inovação prioritários. Tampouco podem investir em créditos originados ou cedidos por partes relacionadas, como administradores e gestores do próprio fundo.
Os FIDCs oferecem um conjunto diversificado de ativos, como recebíveis de empresas e títulos de dívida em setores variados, proporcionando aos gestores a flexibilidade de definir estratégias de alocação que podem gerar retornos elevados. No entanto, devido à complexidade e ao risco inerente a esses ativos, os FIDCs foram historicamente acessados apenas por investidores qualificados ou profissionais, mais capacitados para absorver e gerenciar tais riscos. Ainda que existam casos isolados de problemas em FIDCs, medidas importantes foram implementadas para mitigar riscos, como a introdução de duplicatas eletrônicas, que reduzem a probabilidade de fraudes.
Embora o investidor de varejo demonstre interesse, a criação de produtos compatíveis ainda é limitada. O controle de risco necessário para os FIDCs voltados ao varejo reduz a possibilidade de retornos mais elevados, o que limita a atratividade dos fundos para investidores em busca de rentabilidades competitivas. Essa abordagem, no entanto, é fundamental para proteger o investidor de varejo, mas desafia a flexibilidade de gestão dos FIDCs, que historicamente atraiu uma base institucional em busca de retornos diferenciados. O desafio para os gestores está em ajustar o perfil de risco dos FIDCs e, ao mesmo tempo, preservar sua atratividade oferecendo uma rentabilidade competitiva. Esse processo pode demandar novas discussões com a CVM, além de investimentos em ativos de menor prazo ou em setores considerados mais sólidos, ou até mesmo a redução de custos operacionais para aumentar a eficiência do fundo.
Esse é um processo que deve ocorrer ao longo do tempo, à medida que o mercado evolui e amadurece. Com a Resolução 175, a CVM estabeleceu as bases para o ingresso do varejo nos FIDCs, e, com o desenvolvimento gradual dos produtos e das regras, a classe de FIDCs poderá se consolidar como uma opção de investimento viável e segura para o pequeno investidor.
Fonte: https://valor.globo.com/financas/coluna/os-desafios-do-fidc-no-varejo.ghtml